segunda-feira, 15 de junho de 2009

A Biocomplexografia de Donatto Leão - Parte 2

Continuação, como prometido.
Boa semana à todos!
Abraços amarelos, Daniel.
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Capítulo 2 – Gorduchinho

. Como disse, nunca tive vontade de rir. Claro, hipocrisia de minha parte, dizer que nunca ri até meus 26 anos. Tive momentos felizes, mas não foram suficientes para dar aquela gostosa dor no estômago de tanto rir. Ou chorar de rir.
. Achava tão estranho quando alguém me falava que tinha “chorado de tanto rir”, afinal, na minha visão, chorar era inversamente proporcional a rir.
Nasci num dia chuvoso. Meus pais engravidaram sem querer, por isso a vida toda fui chamado de “filho do susto”, porque não era a intenção.
. Eles eram muito novos, não tinham condições de cuidar nem deles próprios, quiçá de uma criança? Meu pai tinha 20, minha mãe tinha 19.
. Na escola era motivo de cochicho a idade deles, porque meus amiguinhos tinham pais com 40 anos, 50 anos e tinha uns com pais de até 60 anos! Meu pai me falava que era bom que eles fossem jovens, porque eu não agüentaria ficar o dia todo ajudando minha mãe a fazer crochê ou vendo Gugu aos domingos com meu pai. Fora que quando nos formamos, poucos eram os amigos que tinham, como eu, os pais ainda vivos. Essa era a vantagem, mas a desvantagem era toda aquela habilidade de meus pais em cuidar de um filho.
. Minha mãe não sabia que eu precisava ser vacinado, achava que se ela colocasse a chupeta na minha boca eu iria dormir e nunca quis me dar de mamar no peito, porque ela tinha medo que eu arrancasse os seus bicos (ela não se tocava que nem dentes eu tinha!). As minhas avós a cornetavam tanto, dizendo que eu não era uma boneca, como ela estava acostumada, e que um paninho só não adiantaria para a minha higiene, muito menos me deixar dormindo sem fraldas.
. Antes mesmo de sair do hospital, toda minha falta de sorte começou.
. O médico que realizou meu parto, um tal de Dr. Jerônimo de Albuquerque, deve ter feito medicina no Instituto Universal Brasileiro. Nada contra cursos à distância, mas o retardado não fez os exames necessários, me derrubou sem querer no chão e quase me matou ao me afogar inocentemente na banheira, onde a enfermeira iria tirar toda aquela gosma que fica em qualquer bebê.
. Depois disso ele matou mais algumas crianças, até que seu registro no CRM foi cassado. Hoje em dia ouvi dizer que ele ganha muito dinheiro fazendo aborto em uma clínica clandestina, um absurdo, claro, mas pior é quem o procura.
. Com 1 mês de vida, devido a todo o erro médico, fui liberado para enfim sair e respirar novos ares. Como era inverno, esses novos ares me geraram uma gostosa e dolorosa pneumonia. Mais 1 mês internado.
. Saí novamente do hospital, mas como era esperado, estava desnutrido, muito abaixo do peso, então minha mãe me empaçocou de mingau, leite, papinha e engordativos infantis. Acho que ela estava tão desesperada que até cachaça experimentou me dar, porque seu tio da roça falou que “abria o apetite”. Coitada dela, coitado de mim. Engordei, parecia uma bolinha, ou bolona, daquelas de parque de diversões, que furam no primeiro “pong” no chão.

***

. Meu pai se formou na faculdade, Arquiteto, e enfim arrumou um bom emprego. Eu já tinha 3 anos. Eles então fizeram minha primeira festinha.
. Convidaram a cidade toda, como a gente morava ainda numa pacata cidade do interior, esse meu exagero nem foi tanto. Convidaram umas 200 pessoas, pelo menos, e gente que nem me conhecia.
. Bom para os convidados, que se empanturraram, não me deram presente, sujaram toda a casa da minha Vó Dita e picaram a mula, na hora que meu avô apareceu com a espingarda mandando todo mundo à merda, porque era o único sensato naquela casa.
. O prejuízo da festa foi tamanha, que meu próximo bolinho veio somente aos 6 anos. Convidaram apenas os amiguinhos da escola. Tinha umas 30 crianças na minha sala, mas como a maioria me achava esquisito, apareceram umas 12 crianças, sob a promessa de comer todas as balas de coco, todos os bombons e sair, antes mesmo do parabéns. Foi bom, uma festa para a família, que foi o que restou, exceto meu tio Timóteo, que foi embora antes da primeira hora da festa, alegando estar passando maus bocados por causa de uma coxinha de frango estragada que ele tinha comido na pastelaria do japonês Hikari. Nem presente o muquirana deixou!
. Quando fiz 12 anos, por uma felicidade, dei uma boa esticada na minha altura, e a fama de bolinha se foi.
. Me tornei um belo adolescente, mas sem amigos, e os que tentavam se aproximar não suportavam minha falta de assunto. Quem não se interage, não tem papo mesmo.
. Teve uma menina, a Neide, cujos olhos verdes eram tão belos que jamais vi iguais, que tentou me roubar um beijo certa vez. Como disse, eu era bem bonito, não que não seja mais, mas adolescente sempre é feio, cheio de espinha na cara e coisas do tipo. Eu não, era bonitão, e o melhor de tudo que pela minha altura eu parecia ter uns 18 anos, quando na verdade tinha 13.
. Nos intervalos do colégio que eram regados de beijocas, jogos de futebol e truco, minha maior diversão eram os jogos eletrônicos, ainda mais depois que consegui, com muita economia e esforço, comprar um Game Boy Color ®, e jogava o intervalo todo ou até a bateria acabar. Nesta época conheci um amigo: Luciano.
. Luciano era como eu: parecia louco mas não era, introvertido e sua única diversão era comer bastante bobeira, jogar videogame e ser chamado de maluco pelo resto da turma.
. Começamos a jogar videogame juntos. Um dia eu ia à casa dele, no outro ele ia em casa. E na escola todos chamavam a gente de doidos varridos, só que agora economizavam garganta, chamavam ambos de “Casal gay”.
. Nos formamos na oitava série juntos, fizemos o ensino médio juntos, e, faltando 6 meses para nossa formatura, decidimos fazer uma viagem para o Pantanal, porque Luciano tinha a mania de catalogar aves, e gostaria muito de conhecer as aves de lá. Como eu colecionava apenas frustrações, decidi acompanhá-lo. Para os nossos pais, era tranqüilo, até porque com a economia em não pagar o baile e a viagem de formatura, sobrava dinheiro se pagassem apenas esta singela viagem. Iríamos ficar em uma pousada simples e barata, com a única promessa de trazer lembrancinhas para todos.
. Uma semana antes da viagem, Luciano morreu. Foi atropelado por um funcionário da prefeitura, que bêbado, passou com o caminhão de lixo em cima do rapaz.
Quando fiquei sabendo, chorei durante umas 2 semanas seguidas, e fui internado por desidratação e desnutrição, porque não comia, não bebia e chorava. Os pais dele não ficaram tão transtornados quanto eu. A única pessoa que pensava como eu, agia como eu e me entendia havia morrido. Daquele jeito.
. Meus pais tentaram agradar, me compraram um videogame novo, mas tudo relacionado a comportamentos “nerds” e produtos tecnológicos me lembravam dele. Não adiantava.
Estava bem de notas, mas com o fracasso de meu último bimestre na escola, o diretor achou melhor me reprovar. Porém meu pai o fez mudar de idéia depois de umas três ou quatro pancadas na cara dele.
. Minha vontade de passar no vestibular se foi, não consegui nada. Então passei o ano de 2002, quando completei 18 anos, fazendo apenas cursinho pré-vestibular, em um bom colégio de minha cidade. Mas meu pai, visando melhoria de vida, já que sustentava ele, eu, meus dois irmãos, minha irmã e minha mãe, se mudou para São Paulo.
. Comecei tudo de novo e não passei no vestibular. Mas foi bom, no colégio que estudei em São Paulo, conheci a Fátima.

2 comentários:

Pudim disse...

A cada capítulo que passa aguardo mais ansioso que o Donatto dê umas boas risadas! Risadas de verdade, puras, daquelas que só carregam felicidade.

Este está ainda melhor que o outro. Meus parabéns.

Josy Poulain disse...

Cá estou novamente procurando as opiniões amarelas.

Comos sempre mt bom.
Abraços amarelos.