segunda-feira, 22 de junho de 2009

A Biocomplexografia de Donatto Leão - Parte 3

Continuando...
Obrigado a quem lê e a quem lê e comenta.
Uma boa semana a todos.
Abraços BEEEM AMARELOS!!!
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Capítulo 3 – Fátima

. Me apaixonei por ela, e, sem compreender, ao lado dela eu perdia completamente a timidez. Me lembrei de como era com meu finado amigo Luciano. Conseguia falar duas ou três palavras e conjugava corretamente o verbo quando falava com ela. Bom sinal.
. Não esqueci da amizade que tinha pelo Luciano, mas conhecer a Fátima me fez ter uma visão turva de passado com meu grande amigo.
. Numa tarde de quinta-feira, quando estudava Química Orgânica na Sala 103 do Colégio Gustavo Hertz, onde fiz o pré-vestibular em São Paulo, Fátima entrou na sala, com o intuito de estudar comigo, ou outra intenção. Na verdade não sei dizer ao certo até hoje, e nem me interessa mais também, claro.
. O que sempre desconfiei é que ela tinha dó de mim mesmo, porque dos 80 alunos que minha sala tinha, 79 conversavam entre si, e eu comigo mesmo. Comigo e com meu Game Boy Advance ®.
. - Posso estudar com você? – Disse ela, com aquela voz linda que só ela tinha.
. - Comigo? Certeza? Estou estudan...
. - Química Orgânica? Me ensina, sou péssima em Química Orgânica.
. Assim ela conseguiu, como um milagre, puxar conversa comigo. Afinal, eu era um nerd recalcado.
. Passava noites em claro sonhando em beijá-la, e aí que entra a história do guarda-roupas. Desenhei uma boca na parte interna dele e simulava beijos para saber se eu levava jeito. O problema que tinha me esquecido, era que a boca não era plana, nem de madeira.
. Certo dia, novamente estava eu, estudando Química Orgânica de novo, e ela apareceu.
. Fechou a porta, passou ao meu lado e eu já sentia o seu perfume de flores do campo. Parecia com o cheiro do talco que minha mãe me passava para ir ao colégio aos 10 anos, que me deram o carinhoso e simpático apelido de “Pompom”. Azar, gostava daquele cheiro.
. - Oi Donatto, Química Orgânica de novo? – ela falou e eu tremi. Pressentia algo.
. - Sim, como sempre, nos encontramos na Química Orgânica!
. - Ah Donatto, então você acha que temos Química? – disse ela, sorrindo, e eu, idiota.
. - Temos sim, às segundas nas duas primeiras aulas, e hoje são as duas últimas.
. - Não. Outra Química?
. - Ah ta, desculpa Fátima. Esqueci. O plantão é as 18 horas de sexta. Tem dúvidas?
. - Tenho sim, Donatto, tenho sim. Me ensina a sua Química!
. Juro por Deus, não entendia nada daquela conversa torta. Como eu era idiota, e como ela era paciente. Infelizmente depois que começamos a namorar, ela ficou idiota e eu paciente!
. Como eu não entendi as indiretas mais diretas que ela tinha me dado, ela saiu da sala, com certo descontentamento. Eu continuei estudando.
. À noite, na novela das oito (sim, assistia a novela, escondido em meu quarto, para ver os atores se beijando e tentar entender toda aquela engenharia), ouvi o casal principal conversando sobre rolar uma Química entre eles. Naquela hora me senti como aqueles desenhos em que o Tom tem uma idéia e aparece uma lâmpada dentro de uma nuvenzinha. Ela me deu bola e eu não liguei.
. O que eu não sabia era que foi a melhor coisa que fiz, porque a rejeição a deixou mais louca ainda por mim.

***

. Cheguei na aula, no outro dia, e o rapaz da minha frente, um skatista apelidado de “Shape”, por causa de seu físico magricela, me entregou um recado e disse:
. - Mandaram te entregar. Não sei quem foi, então não me pergunta, cara!
. - Está bem!
. No bilhete estava escrito: “Te espero às 18h na Lanchonete do Quinho. Mata o plantão de Química Orgânica hoje. Estarei com uma blusinha amarela. Beijos”.
. Na hora, como sempre ficava ao faltar ar em meus pulmões, fiquei verde. E não era o reflexo daquela camiseta “SK8ER Boy” que o Shape usava. E às 18h fui lá.
. A lanchonete do Quinho era um lugar descolado, aonde todo mundo do cursinho ia lá para comer, matar as aulas maçantes de Física Geral e tomar cerveja ou pinga com refrigerante vagabundo. O lugar era bem limpinho sim, mas mesmo assim nunca tinha entrado lá.
. Vestia meu Allstar preto, meu jeans surrado e minha camisa xadrez cinza. Eu parecia um Grunge. Tive sorte naquele tempo, porque nos dias de hoje me chamariam de Emo.
. Olhei para todos os lados, vi todas as cores, uma salada de frutas de pessoas, menos a bendita banana. Não tinha ninguém de amarelo, e eu tinha jogado fora o bilhete, com medo de alguém ver.
. Ficou a dúvida: estava escrito amarelo mesmo? Quem era? Raios!
. De repente, senti seu perfume... era Fátima! Olhei para trás, ela não imaginava que eu chegaria pontualmente às 18h e resolveu atrasar um pouco. Estava de amarelo.
. Foi o amarelo mais bonito que já tinha visto, mas tempos depois, em visita à Macchu Picchu no Peru, vi algumas peças de ouro mais bonitas.
. - Você recebeu meu recado, então? – Disse ela, com um belo sorriso no rosto.
. - Era seu? – Que vergonha de minha vergonha. Se tem alguma coisa que eu me arrependo de ter feito é de não ter feito várias coisas por ser um idiota tímido.
. - Sim, até achei que não viria...
. Nessa hora fiz umas duzentas e quarenta e oito orações para que ela me beijasse logo, porque eu não teria tal atitude.
. - Vamos sentar! – disse com uma gagueira total – Quer um suco?
. - Prefiro Coca.
. - Comum ou light?
. - Don, posso te chamar assim? Deixa que eu peço ao garçom, você está meio esquisito.
. - Ok, eu quero suco de maçã.
. Neste momento ela começou a rir, não sei por qual motivo, mas acho que suco de maçã na minha idade era um tanto quanto quadrado. Azar, eu gostava, e ainda gosto. Suco de maçã com saquê fica uma delícia!
. Papo vai, papo vem, acho que duas horas depois, ela já estava totalmente doida para me agarrar, e eu nem tirava as mãos do bolso. Uma hora ela ficou irritada e me perguntou:
. - Donatto, você é gay ou não faço o seu tipo?
. - Como assim, Fátima? – dei de louco para viver – te acho linda e não sou gay. - não sei como saiu isso da minha boca.
. - Por que você não me beija, então? – disse ela, com uma voz irritada e excitante.
. - E por que VOCÊ não me beija, então? – respondi, uma idiotice, que deu certo.
. Ela me agarrou pelo colarinho fechado de minha camisa de flanela xadrez, deu um beijo estilo desentupidor de pia, que quase fiquei sem ar, ou seja, verde.
. - Agora está bem? – disse ela, sorrindo.
. - Já estamos namorando? – mais uma ingenuidade de um ser que não era do seu tempo.
. - Tão rápido assim? Tudo bem...
. A sorte maior minha era ser bonitão e ela por uma estranheza toda gostar de mim.
. Foi assim, durante um ano foi uma maravilha.
. No segundo ano, chegamos nos “finalmentes”, claro, se dependesse dela, aconteceria no primeiro mês, mas eu era muito ruim para perceber indiretas e aprender a beijar e a transar no mesmo ano era muito para minha cabeça. Mas depois da primeira, diariamente "batia o cartão".
. No terceiro ano, depois de uma briga, ela saiu, encheu a cara e beijou um tal de Edmundo.
. O que? Já ouviram falar nesse nome antes? Ah sim, mas não, era outro Edmundo.
. O cúmulo da falta de sorte com Edmundos, realmente.
. No quarto ano de namoro, por incrível que pareça foi o melhor ano junto dela. Viajamos pela América Central e do Sul nas férias, como mochileiros, e foi muito bom. Parecia que tudo tinha sido resolvido entre nós, mas não podíamos casar ainda, queria me formar primero.
. No quinto ano, brigávamos 1 dia da semana no mínimo.
. No sexto ano, brigávamos 2 dias da semana no mínimo.
. No sétimo ano, brigávamos 3 dias da semana, no mínimo e em 2 destes ela me traia com um tal de Ulysses.
. No oitavo ano, que foi o último, brigávamos 5 dias da semana, sendo que dois dias que não brigávamos ou eu trabalhava ou ela estava com um tal de Estevam.

. Por fim terminamos, naquele fatídico dia em que ela me deixou à pé no motel e correu para os braços do Edmundo (Edmundo 2), com o meu carro!
. Pois bem, agora vou parar de lembrar disso e este capítulo 3 será pouco lembrado após este ponto final.

Um comentário:

Pudim disse...

Tudo seguia um crescimento exponencial de ansiedade e felicidade, até que ele lembrou da história do motel. Pobre Donatto, assombrado pelo passado.

Admito que não consegui conter o sorriso em meus lábios durante todo o texto. O melhor capítulo até agora, acho que pela sinceridade.